Para o criminalista Pedro Serrano, “existe um certo momento em que os investigadores podem dialogar, mas eles não podem trazer documentos nem ter acesso a documentos. E isso se demonstrou na Lava Jato que houve”.
Por Luis Nassif e Cintia Alves, do GGN
No capítulo anterior (assista aqui ao episódio 1 da série “Lava Jato Lado B – A influência dos EUA e a indústria do compliance”) mostramos como os Estados Unidos montaram uma grande estrutura para combater corrupção e terrorismo, que passou a influenciar o Ministério Público e o Judiciário de vários países, especialmente o Brasil, através da Lava Jato.
Aqui vamos abordar a primeira parceria relevante entre autoridades brasileiras e norte-americanas, a operação Banestado.
Vamos ver ainda como cooperações entre países aconteceram sem que a Lava Jato e o governo brasileiro esboçassem o menor gesto em defesa dos interesses nacionais.
DO BANESTADO À LAVA JATO: A COOPERAÇÃO BRASIL-EUA
A Operação Banestado investigou um grande esquema de corrupção que remeteu pelo menos 30 bilhões de dólares para o exterior no final dos anos 1990.
As transferências ocorreram a partir de contas do tipo CC-5, ligadas especialmente a uma agência do Banestado em Nova York. De lá, o dinheiro era distribuído em paraísos fiscais pela Europa e Caribe.
Ser dono de uma CC-5 não era um crime em si, mas a força-tarefa precisaria investigar e separar o joio do trigo, porque essa modalidade de conta também era usada para evasão de divisas, sonegação de impostos e lavagem de dinheiro.
Com políticos e grandes empresários envolvidos na trama, a autonomia da Polícia Federal e do Ministério Público para levar a apuração até as últimas consequências foi colocada à prova.
No Brasil, os trabalhos começaram depois da CPI dos Precatórios, quando descobriram movimentações suspeitas em agências do Banestado na fronteira com Argentina e Paraguai, região com fama de lavar dinheiro do narcotráfico.
O sigilo dessa primeira camada de contas foi quebrado, e os dados levaram a força-tarefa ao Banestado em Nova York.
A equipe do delegado José Castilho viajou aos Estados Unidos em busca de ajuda.
Com apoio do Departamento de Segurança Interna, o DHS, e o trabalho de um procurador distrital em Manhattan, foi possível ter acesso a documentos bancários.
A polícia brasileira então recebeu dados suspeitos, principalmente a respeito da Beacon Hill Service.
A offshore tinha uma espécie de conta-mãe no banco JP Morgan Chase, que abastecia várias outras subcontas.
Uma delas tinha um nome sugestivo: chamava-se “Tucano”, e por ela teriam passado milhões de dólares entre 1996 e 2000.
Extratos bancários indicavam que José Serra teria acesso a esta conta.
Na época, investigadores disseram que poderia se tratar de José Serra – hoje senador e um dos principais ministros do governo FHC durante as privatizações – ou que poderia se tratar de outra pessoa que por coincidência tinha mesmo nome e sobrenome. Essa parte da denúncia jamais foi resgatada pela Polícia Federal ou Ministério Público.
Serra foi um dos políticos que logo perceberam a influência crescente dos Estados Unidos sobre as investigações brasileiras, após a parceria no Banestado.
Em 2007, depois de ser eleito governador de São Paulo, o tucano se lançou numa tentativa frustrada de se aproximar do Departamento de Segurança Interna, que reúne todo o serviço de inteligência norte-americano. Ele usou como pretexto ataques do PCC ao Metrô para solicitar treinamento contra terrorismo.
Essa tentativa de aproximação foi revelada pelo Wikileaks. Documentos mostram que Serra queria um canal direto com as autoridades estrangeiras, sem passar pelo Ministério das Relações Exteriores ou outro setor que tivesse a obrigação legal de intermediar a comunicação entre os dois países.
As informações que os Estados Unidos enviaram ao Brasil movimentaram a cena política e permitiram à Polícia Federal deflagrar, em 2004, uma nova fase da operação, batizada de Farol da Colina.
Outro fator que ajudou a dissolver a operação ao longo do tempo foi a fragmentação e distribuição dos processos por diversos tribunais. O ex-juiz Sergio Moro herdou algumas dessas ações.
Ele condenou, por exemplo, o doleiro Alberto Youssef, que fechou um acordo de colaboração no Banestado, voltou a operar no mercado de câmbio e, anos depois, virou um dos principais atores da Lava Jato, mais uma vez beneficiado por uma delação.
Os delegados Erika Marena e Márcio Anselmo, que investigaram a Petrobras, também têm passagem pelo caso Banestado. Os dois ganharam cargos em Brasília quando Moro abandonou a toga para ser ministro de Jair Bolsonaro.
O procurador Januário Paludo e Carlos Fernando dos Santos Lima, que se aposentou do Ministério Público em 2019, trabalharam juntos nas duas operações.
Carlos Fernando foi o coordenador da força-tarefa durante a operação Farol da Colina, e protagonizou discussões polêmicas na CPI do Banestado.
Primeiro porque ele e o procurador Vladimir Aras, hoje responsável pela cooperação jurídica internacional da Lava Jato, supostamente tentaram dificultar o acesso dos parlamentares a documentos produzidos nos Estados Unidos.
Além disso, Carlos Fernando foi casado com uma funcionária do Banestado enquanto investigava a instituição financeira.
Juiz, delegados, procuradores. Estavam ali os principais atores da futura operação contra a Petrobras, desde então parceiros dos Estados Unidos.
A aproximação entre autoridades dos dois países continuou se intensificando nos anos seguintes ao Banestado. E Sérgio Moro trabalhou ativamente para consolidar essa parceria.
Era tal o entrosamento com os norte-americanos que, em 2007, Moro autorizou indevidamente que um agente do FBI tivesse acesso a documentos falsos para trabalhar como infiltrado numa operação no Brasil. A decisão foi indevida porque o então juiz não ouviu o Ministério Público, como manda a lei.
“Moro é claramente um líder disso. Ele tinha os olhos o tempo todo em cima do golpe, e há muitas evidências disso. “E ele era muito próximo dos Estados Unidos. Ele já veio aqui, ele tinha contatos aqui. Então acho que ele teve um papel chave. Ele fez tudo ser tão óbvio ao se tornar ministro da Justiça depois de ter entregado a eleição para Bolsonaro prendendo Lula, que teria vencido a eleição de acordo com todas as pesquisas. Acho que esse foi o papel dele e como ele será lembrado”, diz o economista e pesquisador norte-americano Mark Weisbrot.
A OPERAÇÃO PONTES E O PROJETO PILOTO
No esforço de penetrar cada vez mais no sistema Judiciário brasileiro, em 2009 o Departamento de Justiça dos Estados Unidos bancou, no Rio de Janeiro, um seminário batizado de Projeto Pontes. O evento durou uma semana, com a presença de policiais, promotores e juízes de todos os cantos do Brasil, além de delegações de outros países latino-americanos. Sergio Moro estava entre os palestrantes.
O Wikileaks revelou que o principal tema em discussão foi o modelo de força-tarefa proativa, com possibilidade de colaboração direta entre os agentes brasileiros e estrangeiros.
Na conclusão do seminário, os norte-americanos sugeriram a montagem de um projeto piloto que deveria rodar numa cidade como Curitiba ou São Paulo. Eles prometeram aos brasileiros “acesso a especialistas dos Estados Unidos”, e incentivaram que o experimento fosse levado a um tribunal. Estava ali o que poderia ser o embrião da Lava Jato.
“Acho que o treinamento por agentes americanos, por órgãos americanos, pela justiça americana, inclusive faculdades americanas… Treinamento de procuradores, juízes, até ministros, acho um tanto quanto problemático. Estamos importando certas excessos punitivistas sem dar as garantias que esses sistemas têm”, diz a advogado Valeska Teixeira.
Hoje, a Lava Jato nega que tenha feito cooperação com os Estados Unidos ou outros países sem respeitar os canais oficiais.
Mas a ponte que conecta a força-tarefa diretamente com os norte-americanos ficou escancarada em 2017, quando Kenneth Blanco, um integrante do alto escalão do Departamento de Justiça, revelou que os procuradores daqui trabalharam lado a lado com os correspondentes de lá, compartilhando informações de inteligência à revelia da autoridade central brasileira.
Somente quando o material estava pronto para ser levado ao tribunal é que a Lava Jato usava o protocolo correto de cooperação internacional. Assim, passava um verniz de legalidade em cima de provas obtidas de maneira irregular.
“No centro da enorme cooperação entre nossos dois países, está uma forte relação construída na confiança. Tal confiança, como alguns aqui chamam de confiança, permite que promotores e agentes tenham comunicação direta quanto às provas”, diz Kenneth Blanco.
“No começo de uma investigação, um promotor, ou um agente de uma unidade financeira do país, pode ligar para seu parceiro estrangeiro e pedir informações financeiras, por exemplo, minhas contas bancárias. Uma vez que a investigação tenha chegado ao ponto em que os promotores já estão prontos para levar o caso ao tribunal, as provas podem ser requeridas através do canal de assistência jurídica mútua, para que possam ser admitidas no julgamento”, acrescenta o procurador dos EUA.
Para o criminalista Pedro Serrano, “existe um certo momento em que os investigadores podem dialogar, mas eles não podem trazer documentos nem ter acesso a documentos. E isso se demonstrou na Lava Jato que houve.”
“Foi tudo tratado entre os ministérios públicos, e não existe isso no contexto do direito internacional. Os ministérios públicos não podem fazer tratados entre si porque não são poderes soberanos. Houve no caso Petrobras um abandono do governo brasileiro”, comenta o advogado e consultor André Motta Araújo.
Essa intimidade entre autoridades brasileiras e norte-americanas explica como um crime ocorrido no Rio de Janeiro, com personagens de Brasília, foi parar em Curitiba, aos cuidados de um juiz parceiro dos Estados Unidos.
Para se chegar nesse ponto, os princípios que regem a cooperação internacional no Brasil claramente foram flexibilizados.
Décadas atrás, as cooperações se davam por via diplomática e serviam apenas para extradição. Com o avanço das organizações criminosas, os diplomatas foram substituídos aos poucos pelas autoridades centrais, que são definidas segundo cada tratado ou acordo que o Brasil assina com países ou organismos internacionais. No caso da Lava Jato, que envolve cooperação em matéria penal com os Estados Unidos, a autoridade central é o Ministério da Justiça.
Mas o Ministério da Justiça, chefiado por José Eduardo Cardozo na época em que Lava Jato estourou na mídia, delegou o poder para o então procurador-geral da República, Rodrigo Janot. E Janot, de acordo com seu livro de memórias, passou o controle para as mãos da Lava Jato.
Esse foi o caminho que submeteu a Petrobras a multas bilionárias nos Estados Unidos, afetando gravemente sua imagem e promovendo o desmonte amplo da engenharia nacional.
“Por que existe a figura da autoridade central representando o Estado? Porque é fundamental que alguém fale pelo País, e não por uma corporação dentro do País. A autoridade central jamais poderia ser delegada”, explica Araújo.
“As relações internacionais entre Estados se dão pelo canal diplomático, não pelo canal judicial. Não poderia nunca haver contato, o procurador-geral ir lá. Quem faz isso é o canal diplomático, porque o Estado é o conjunto, não é só a Justiça”, acrescenta.
“O que me parece é que falharam os mecanismos de controle. Nós levamos formalmente aos processos essas notícias, de que as cooperações não estavam observando os tratados internacionais que o Brasil firmou e se obrigou a cumprir. Juridicamente, isso seria suficiente por si só para anular todo o processo”, apontou o advogado Cristiano Zanin.
“Nós tentamos, ao longo das audiências, ao longo dos processos, obter informações sobre essa suposta troca de conhecimento. E tudo isso foi negado peremptoriamente sobretudo pelo então juiz Sérgio Moro”, alertou.
Esse arranjo entre procuradores, que chuta para escanteio a figura da autoridade central, foi o que garantiu à Lava Jato acesso privilegiado ao serviço de inteligência estrangeiro.
Isso não aconteceu somente em relação aos Estados Unidos. O dossiê do site The Intercept Brasil mostrou que a força-tarefa em Curitiba também tinha conexão direta com autoridades da Suíça.
“Quando você traz um documento ilicitamente da Suíça, você está vulnerando a Constituição suíça e a brasileira, porque elas garantem certos direitos e garantias, tanto que um procurador suíço foi punido lá por causa disso. Por ter feito lá o que eles chamam de colaboração selvagem”, comenta Pedro Serrano.
“Ali na Vaza Jato tem gravações que falam em falsificar registros, falsificar material ideologicamente, isso é grave. Fala em procurador ter trazido material ilegalmente da Suíça, num pendrive. Isso é grave. Em qualquer País sério do mundo, isso seria motivo para anulação de toda a operação”, frisa.
Trocando informações diretamente com a Suíça foi que a equipe do procurador Deltan Dallagnol conseguiu material para pressionar investigados e gerar prisões preventivas. A estratégia era deixar os réus de joelhos, inclinados a delatar o que fosse necessário, quando fosse necessário.
Assim nasceu a Operação Lava Jato.
A nossa equipe de reportagem tentou entrevistar José Eduardo Cardozo, ex-ministro da Justiça, mas ele não respondeu as nossas mensagens.
Já os procuradores da Lava Jato em Curitiba negaram a cooperação informal com agentes estrangeiros. Por e-mail, eles afirmaram que:
“Todo pedido de cooperação internacional para os Estados Unidos, ou dos Estados Unidos, foi acompanhado pela Secretaria de Cooperação Internacional da Procuradoria-Geral da República e pelo Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional, do Ministério da Justiça.”
“As informações sobre o caso Lava Jato foram fornecidas pela própria Petrobras para as autoridades norte-americanas, com o objetivo de obter uma redução em eventual penalidade.”
Além disso, eles sustentaram que “a razão pela qual a Petrobras esteve sujeita a penalidades na jurisdição norte-americana foi a existência de um grande esquema de corrupção político-partidário e de falhas do sistema de compliance em sua gestão.”
Como Moro conseguiu, em apenas uma semana, desmoralizar os três poderes da República? Esta é uma pergunta que muitos devem se fazer.
Moro orbitou junto ao Ministério Público para denunciar Glenn, por vingança, por ter revelado, através do Intercept, muias de suas trapaças na Lava Jato. Foi ainda mais longe, mostrando que tem total controle sobre o aparelho judiciário do Estado, fazendo Fux suspender, como queria Moro, o juiz de garantias. Moro atropelou não só a Presidência, o Congresso, mas o próprio STF.
O último episódio, na mesma semana, foi ter colocado Bolsonaro de joelhos diante das câmeras em rede nacional ao vivo e a cores, fazendo revogar a decisão de tirar de suas mãos a pasta da Segurança Pública e, consequentemente, a Polícia Federal.
Uma coisa a gente aprendeu com muita clareza com a vaza jato. Moro não joga pra perder e muito menos joga limpo.
Moro é frio, calculista e quer ter o controle total da manete para salvar aliados ou matar seus adversários usando os métodos fascistas nas sombras do poder, dignos dos ditadores mais facínoras.
No dia da prisão de Lula quem deu todas as coordenadas para a PF, foi Moro, ainda juiz.
No dia em que o desembargador Rogerio Favreto deu a ordem de soltura de Lula, Moro abandonou as férias e manipulou, desde a carceragem até os seus aliados do TRF-4 para que Lula não fosse solto.
Moro já havia mostrado, no episódio em que grampeou e vazou para a Globo o conteúdo da ligação de Dilma para Lula, que ele cometeu dois crimes, o da clandestinidade da gravação, pois, no momento em que gravou a conversa, Moro já não estava mais sob a cobertura de seu próprio despacho, pois naquele momento já estava suspendido a operação. Mas Moro continuou agindo como um hacker e fez questão de, pessoalmente, entregar a gravação para a Globo e propor chamadas fora do Jornal Nacional para insuflar a sociedade contra Dilma, com o objetivo de botar mais fermento no golpe. Pior, editou a gravação, como ficou comprovado, fazendo parecer que havia uma armação de Dilma para dar a Lula o foro privilegiado. Tudo pensado e calculado para fornecer matéria prima para seu objetivo principal, tirar Lula da disputa presidencial e barganhar com Bolsonaro ou Alckmin um assento no Ministério da Justiça e da Segurança Pública. Para quê? Provavelmente para ter o maior banco de dados possível para oferecer proteção a aliados, como se viu pela Vaza Jato ele abortando uma investigação contra FHC, manipulando o PGR Aras para que interferisse no caso Marielle para desqualificar a acusação de envolvimento do clã Bolsonaro com o caso.
Não deu exatamente certo esse caminho, então Moro buscou outro ainda mais perigoso e cruel, colocou seus gorilas da PF para dar um calor no porteiro do condomínio de Bolsonaro, arrancando dele o máximo de informações daquele fatídico dia do assassinato de Marielle para usar, de uma lado, como chantagem e, do outro, pressionar o porteiro para se auto delatar, dizendo que a culpa no final das contas, foi dele, do porteiro. Uma história que beira ao ridículo, maior que a falsa facada de Bolsonaro.
A verdade é que, como diz o ditado popular, Moro veio fazendo vidinha. Ninguém sabe exatamente como e porque ele foi parar na fase final da farsa do mensalão como assistente da ministra Rosa Weber, mas certamente, ao contrário da fantasia tosca que conta de que a Lava Jato foi inspirada na operação Mãos Limpas da Itália, Moro, que já tinha um bom know hall de parceria com Youssef no caso assombroso do Banestado, a partir a ação penal 470, deu início a toda a farsa da Lava Jato, utilizando seu doleiro de confiança, Youssef, para dar o start à novela na qual já havia fechado contrato com a Globo, tanto que foi premiado pelos Marinho antes mesmo da operação ganhar a visibilidade que ganhou.
O fato é que, nesses cinco anos de Lava Jato, Moro, com a assistência direta de Dallagnol, montou certamente o maior banco de dossiês contra políticos, juízes e ministros do STF de que se tem notícia na história do Brasil. E com certeza usa de forma homeopática suas informações de acordo com o caso. No caso de Fux, certamente, não foi uma ameaça de revelar ao Brasil que a cabeleira dele é postiça para fazer o ministro criar uma situação inédita de atropelar, monocraticamente, uma decisão do presidente da Corte no caso da suspensão do juiz de garantias. Aliás, a palavra garantia, para Moro, é sua maior inimiga. Moro é uma espécie de cangaceiro togado que usa todos os subterfúgios, mas sobretudo a força da mídia para impor suas leis, como fez em parceria com a Globo, destruindo reputações e condenando seus inimigos pela força da opinião publicada. Ou seja, o cara é sujo 24 horas por dia em cada passo que dá, em cada grampo que faz, em cada campo que fuça.
Assim também ele tentou ficar maior que Gilmar Mendes quando escaramuçou a sua vida e de sua esposa na Receita Federal, produzindo a ira santa de Gilmar contra ele.
Na ideia de criar uma mera estrutura política com uma fundação privada, usando dinheiro público da Petrobras, numa descarada tungada, tentada por ele e Dallagnol, com R$ 2,5 bilhões, Moro mostra que tem olho em todo o tabuleiro do xadrez, mesmo que jogadas como essa tenham dado chabu.
Seja como for, Moro mostrou que tem munição na manga, e não é pouca, para enfrentar grandes adversários. Com Lula, não teve jeito, teve que se expor muito além da conta e acabou sendo desmascarado pelo Intercept, dando a Lula munição para provar não só ao Brasil, mas também à comunidade jurídica internacional que Moro é um sacripanta. Imagem fixada no documentário Democracia em Vertigem que concorre ao Oscar e faz do bandido de Curitiba um vilão de status internacional, mostrando que, mesmo cercado de cuidados, Moro tem muitas fragilidades e não engana mais ninguém.
Todos sabem que é ele que está por trás da decisão de Fux, assim como da denúncia do procurador Wellington Oliveira contra Glenn, como mostrou os dentes para Bolsonaro e o colocou de joelhos e revertendo, por hora, a decisão de tirar de suas mãos a pasta da Segurança Pública que lhe serve de preciosa máquina de arapongagem e chantagem, mostrando que Moro detém o poder, mas está gastando munição que lhe fará falta mais à frente.
No Brasil, o ódio cresce a olhos vistos. As relações entre pastores evangélicos, policiais e milícias ficam cada vez mais evidentes.
As instituições, assim como a mídia, seguem fazendo cálculos econômicos da situação do país e, enquanto Bolsonaro mantiver esse modelo em que os recursos públicos e as reformas são destinados a beneficiar a elite econômica do país, sua impunidade estará garantida.
Se por um lado, entende-se que Bolsonaro não é causa e sim consequência de uma elite econômica do setor público e privado, por outro, não se tem a mais vaga ideia de qual o tamanho desse buraco e o quanto o comando desse sistema fascista, que tem como brasão a suástica neoliberal, está disposto a se aprofundar.
Há uma nítida falência institucional no Brasil, porque todo o sistema dentro do Estado está rendido e cooptado pela lógica do grande capital, por isso a prioridade de Bolsonaro é alimentar as grandes corporações. O resto, o resíduo, a sobra e as migalhas são destinados ao restante da sociedade.
Grosso modo, essa é a cartilha que Paulo Guedes apresentou a Bolsonaro para que o fantoche se mantenha de pé, blindado em casos escabrosos como o de Queiroz, o assassinato de Marielle e os esquemas cotidianos de corrupção revelados até pela mídia subalternizada pelo mercado dentro do governo.
O último e talvez o mais perigoso seja o da Secom, porque se parece muito com a máquina de propaganda nazista que usava os recursos públicos para fortalecer a imagem de Hitler, ao mesmo tempo em que se envolvia em pesados esquemas de corrupção.
Fica difícil afirmar aonde fica o rabo e o focinho desse monstro que a elite criou para entregar não só a cabeça dos trabalhadores na bandeja, segregar ainda mais os pobres e miseráveis, mas entregar as riquezas naturais, que são patrimônio do povo, a corporações transnacionais, seja em terras indígenas, como prepara Bolsonaro um novo ataque a terras demarcadas, seja tirando da Petrobras o direito de ter a preferência nos leilões do pré-sal.
Daí a impunidade de Bolsonaro, daí a percepção da sociedade de que o Brasil, do ponto de vista institucional, está à deriva, imóvel, sem mostrar qualquer sombra de reação contra o que assistimos e que tem apavorado cada vez mais o mundo.
Mas parece que a embriaguez é tanta, inclusive dos generais que o rodeiam, pela certeza da impunidade, que esse totalitarismo, que envolve corrupção e crimes, não se intimida nem com o isolamento internacional do Brasil que cresce a olhos vistos.
A Lava Jato levou a Petrobras a ser processada nos Estados Unidos. No total, a empresa despendeu 3,8 bilhões de dólares em multa imposta pelo governo norte-americano e indenizações aos acionistas estrangeiros.
As perdas da Petrobras no exterior se devem à montagem de uma estrutura global dedicada ao combate à corrupção, que cresceu exponencialmente após o atentado às Torres Gêmeas, levando o País a se tornar uma espécie de polícia do mundo.
Essa estrutura foi construída a partir de três leis e duas instituições que vamos abordar no primeiro capítulo da série.
As leis permitem investigações contra estrangeiros mesmo quando os crimes não têm origem nos Estados Unidos.
Já as duas instituições fundaram uma notável rede de cooperação internacional, um arranjo que alguns críticos consideram inconstitucional porque desrespeita a soberania dos estados nacionais.
Este vídeo trata da influência dos Estados Unidos na Lava Jato e a indústria do compliance.
São 5 capítulos, no total, cada um abordando uma peça específica desse grande “xadrez” envolvendo a Lava Jato e os interesses norte-americanos:
1- Como a anticorrupção virou bandeira política dos EUA 2- A cooperação internacional BRA-EUA: do Banestado à Lava Jato 3 – A geopolítica do capital: Brasil (e pré-sal!) na mira dos EUA 4 – Os processos que a Petrobras enfrentou nos EUA 5 – A indústria do compliance
Ao EL PAÍS ministro do Supremo afirma que é preciso defender ativamente o Estado democrático de direito para evitar um novo “eclipse institucional”. Magistrado defende criação do juiz de garantias.
Foi em 2013, com o julgamento do escândalo de compras de votos no Congresso mais conhecido como Mensalão, que os ministros do Supremo Tribunal Federal se transformaram em celebridades. A cobertura sistemática das audiências em tempo real trouxe uma transparência até então nunca vista na Justiça brasileira. Mas não sem deixar sequelas. Até hoje Ricardo Lewandowski (Rio de Janeiro, 1948) se ressente dos reflexos do que especialistas chamam de “publicidade opressiva” do julgamento. Não poucas vezes as posições do ministro contrárias à maioria fizeram com que ele fosse tachado de antagonista da luta contra a corrupção. É com certa resignação que Lewandowski encara o isolamento provocado pela superexposição. “Os ministros não têm mais essa liberdade de locomoção. Ficam confinados em suas resistências, aos seus gabinetes, exatamente porque as emoções da sociedade afloram de forma muito viva, tendo em conta as questões polêmicas que são trazidas ao STF”, afirmou ao EL PAÍS em dezembro, em uma das raras entrevistas concedidas desde o Mensalão. Mas a resignação termina por aí. Na conversa —filmada pela equipe da documentarista Maria Augusta Ramos—, o ministro mostra que continua combativo e fiel a seus princípios. Vislumbra, inclusive, que certas operações judiciais e policiais, “de grande impacto midiático” —em alguns momentos cita a Lava Jato explicitamente— “vão ser julgadas de forma muito severas pela história”.
P. Existe uma crítica de que o direito garantista não avança no sentido de alcançar as elites. A Lava Jato trouxe essa sensação catártica de que empresários, que outro dia estavam na capa das revistas, também eram presos. Como o senhor lida com essa percepção?
R. Primeiramente, aqueles que acham que os direitos e garantias do cidadão em juízo são perfumaria só acham isso quando o direito penal é aplicado aos outros. Não quando se trata da própria pessoa, de um parente ou amigo. Aí valem todos os recursos possíveis para se defender e não ser preso. Agora, dos 800.000 presos hoje no Brasil, eu diria que 99,9% são pessoas das camadas sociais mais baixas, os hipossuficientes, os pobres, sobretudo da população negra. Essa ideia de que agora os ricos, os poderosos, estão sendo presos não me parece que corresponde à realidade. As últimas operações tão apregoadas, tão incensadas pela mídia, prenderam muito poucos ricos e poderosos. E os poucos que foram presos já estão soltos, e com seus patrimônios intactos. Na prática, remanesceram presos um ou outro político mais conspícuo.
P. Na teoria, as operações da Lava Jato tinham como missão alcançar todos os extratos do poder em suas relações com a Petrobras. O que deu errado?
R. A verdade é que as operações foram extremamente seletivas, elas não foram democráticas no sentido de pegar os oligarcas de maneira ampla e abrangente. Por isso é preciso ter muito cuidado quando se quer fragilizar os direitos e garantias do cidadão em juízo, dentro de um contexto politicamente matizado. Eu acho que há valores de que não se pode abrir mão de forma nenhuma. São valores que resultam de lutas milenares dos povos contra a autocracia, a tirania, a opressão. É por isso que eu digo que essa avaliação episódica que certas operações produziram pode se mostrar no futuro próximo — e não digo um futuro distante — realmente uma falácia.
P. O quanto a Corte é influenciada pela opinião pública em suas decisões?
R. Eu tenho minhas dúvidas em falar que a sociedade quer isto ou aquilo. Na verdade, a sociedade é muito influenciada pela mídia, que tem preferências relativas a determinadas políticas e soluções, até mesmo as judiciais. Isso, a meu ver, contamina a opinião pública. É difícil separar o que é opinião pública e o que é opinião publicada. Uma mídia como a que existe no Brasil, altamente concentrada, tem um poder muito grande de influência. Existem juízes que podem, eventualmente, ser pressionados, e outros que não. Eu, por exemplo, não me sinto absolutamente pressionado, porque, do momento em que eu ostento sobre meus ombros uma toga, entendo que tenho que cumprir meu dever constitucional de julgar com a máxima isenção possível.
P. Como o senhor avalia a performance da Corte no Mensalão?
R. Eu não posso criticar as decisões colegiadas, ainda que eu tenha tido uma opinião contrária. Mas um ministro da Corte [Luís Roberto Barroso, durante sabatina no Senado, em 2013] disse uma frase que circulou amplamente, que o Mensalão foi um ponto fora da curva. E de fato, se olharmos retrospectivamente, causa no mínimo uma estranheza, uma perplexidade, que as atividades do Supremo Tribunal Federal ficassem paradas durante seis meses para julgar um processo. O trabalho das turmas foi paralisado. Os habeas corpus deixaram de ser julgados para que fosse apreciado apenas o Mensalão. Só isso já é algo a ser examinado pelos futuros historiadores. Há muitas questões que podem ser eventualmente discutidas. Por exemplo, a exacerbação das penas foi algo que aconteceu, a meu ver, pela primeira vez no STF e na história do Judiciário. A aplicação da teoria alemã do domínio de fato de forma muito ampla foi, inclusive, criticada por Claus Roxin, um dos principais elaboradores dessa teoria, em visita ao Brasil. Outra questão é o fato de o processo ter sido fatiado e julgado segundo a ótica do Ministério Público. São várias questões que precisam no futuro ser mais bem avaliadas, sopesadas. Mas eu não estou na posição mais adequada para criticar um julgamento colegiado do qual eu participei e no qual muitas vezes fui vencido. E no qual também, diga-se em meu benefício, muitas vezes meu ponto de vista prosperou e foi adotado pela maioria.
P. O senhor fala da influência da mídia em alguns posicionamentos, mas e o papel das redes sociais?
R. Veja, eu em nenhum momento firmei que a mídia ou a pressão popular influenciaram o julgamento dos ministros do STF ou de outros juízes. Não teria a leviandade de afirmar isso. O que eu quis dizer é que a mídia influencia ou constrói a opinião pública. Aliás, é uma das das funções da mídia esclarecer de maneira a permitir que a opinião pública forme um determinado ponto de vista. O que me parece é que a Internet, pelo menos no que diz respeito às fake news e à intensidade que as mídias sociais ganharam, é um fenômeno relativamente recente. Durante a época do Mensalão, Internet e mídias sociais eram secundárias. Decisivos à formação da opinião pública eram as televisões, as rádios e a imprensa escrita. Ultimamente, talvez de dez anos para cá, é que esse fenômeno surgiu, inclusive, influenciando no processo eleitoral. Isso aconteceu em outros países, que não quero nominar. E aconteceu também, segundo dizem especialistas, no Brasil. Sobretudo a produção das fake news, impulsionadas por robôs, que permitem que milhões de mensagens sejam divulgadas em segundos, o que, segundo os especialistas, pode influenciar de forma muito impactante a opinião pública especialmente no plano de suas opções políticas em momentos eleitorais.
P. Essas campanhas virtuais podem ajudar a enfraquecer o Judiciário brasileiro, como aconteceu em outros países?
R. Esse risco sempre existe. O Brasil a cada 25, 30 anos sofre um eclipse institucional. Nós não podemos excluir este eclipse institucional tendo em conta a própria história do país. O risco é sempre presente. Mas eu penso que a Constituição de 88 tem salvaguardas bastante importantes e tem resistido nestes últimos 30 anos a crises muito sérias. Crises econômicas, impeachment. Mesmo assim, elegemos presidentes, senadores, deputados, governadores, vereadores sem maiores incidentes. Há certa maturidade que o Brasil conseguiu a partir da Constituição de 88, que serve como rede de proteção às instituições. Mas não posso excluir esse risco, sobretudo tendo em conta a experiência internacional em países do Leste europeu, em que o risco se mostrou algo muito palpável.
P. O senhor afirma que a Constituição tem instrumentos muito sólidos, mas o STF tem se valido de um instrumento que é anterior à Constituição, o regimento interno, para justificar algumas demandas, como a abertura do inquérito das fake news. Por quê?
R. O regimento interno do STF é um regimento que passou por várias administrações. Foi em grande parte elaborado sob a égide de outras constituições, mas é um conjunto de regras, como se fossem regras de trânsito. Esse inquérito que foi aberto — e também não quero entrar de forma mais vertical nessa questão porque isso eventualmente pode ser apreciado pelo plenário da Corte— não se confunde com um inquérito policial e muito menos com os inquéritos abertos pelo Ministério Público. É um inquérito que qualquer órgão administrativo pode abrir, estando ou não previsto ou não em seu regimento interno. Um hospital público, se desaparecerem alguns medicamentos de seu almoxarifado, pode abrir um inquérito. Uma universidade pública, se tiver um problema com professores, alunos e servidores, pode abrir um inquérito para investigar. O inquérito que foi aberto no STF tem, sim, amparo no regimento interno, mas é uma providência que qualquer órgão público poderia tomar, porque não é preciso ser necessariamente um órgão judicante para investigar determinados atos que eventualmente possam ser considerados ilícitos.
P. O senhor também foi vítima de fake news?
R. Todos nós somos vítimas de fake news, de um achincalhe pelas redes sociais. Mas isso faz parte, digamos assim, do mundo contemporâneo em que vivemos. As pessoas públicas precisam se acostumar com esse fenômeno. É importante que, sobretudo os juízes, não se deixem abalar com isso.
P. De 2014 para cá, vivemos as revelações da Operação Lava Jato. Mas em junho deste 2019 começou uma revisão palpável dessa operação ambiciosa, com as revelações da Vaza Jato. Como o senhor vê esse processo?
R. Em primeiro lugar eu acho que as revelações do The Intercept são gravíssimas. Denúncias que precisam ser apuradas e que, diga-se, até o momento não foram desmentidas. Agora, o Supremo já corrigiu certos desmandos que ocorreram, não só no âmbito da operação Lava Jato, mas também em outros juízos, de 1º e 2º graus. Por exemplo, a condução coercitiva, largamente praticada no âmbito da Lava Jato, foi considerada inconstitucional. Denúncias e condenações que foram feitas com base só em delações premiadas, o STF disse que são nulas — é preciso haver uma outra prova além daquela informação prestada pelo delator que tem interesse em se beneficiar. O STF fez várias correções no que diz respeito ao devido processo legal. Por exemplo, ainda no caso da delação premiada, dizer que os delatados precisam necessariamente falar por último. Algumas correções de rumo foram feitas antes mesmo do vazamento do The Intercept. E pode ser que, a partir da constatação de que, de fato, algumas ou todas essas denúncias têm correspondência com a realidade, o Supremo aprofunde ainda mais essas correções de práticas que ofendem a Constituição, o Código de Processo Penal e o Código Penal.
P. Mas nem sempre essas correções são unânimes. E muitos interpretam as mudanças no posicionamento da Corte como fonte de insegurança jurídica.
R. Pelo contrário. Na medida em que o Supremo Tribunal Federal confirma os direitos e garantias do cidadão, que estão inscritos na Constituição, em vigor há mais de 30 anos, e que refletem toda uma elaboração histórica, até no plano internacional, de garantias dos direitos fundamentais, isso só pode militar no sentido de dar mais segurança, e não menos segurança. A insegurança ocorre quando um cidadão se coloca nas mãos de um juiz, de um magistrado, ou de um membro do Ministério Público que pode agir com a mais ampla discricionariedade sem atentar para aquilo que está na Constituição, ao Código de Processo Penal.
P. Um exemplo que ilustra essas críticas sobre a insegurança jurídica é o julgamento sobre a questão da prisão após a condenação na segunda instância, que teve em 2016 uma vitória de 6 a 5 para prisão, em 2016. E agora, foram outros 6 a 5 para a ênfase no trânsito em julgado. Por que esses votos tão apertados e num período tão curto?
R. Insegurança gerou a mudança no sentido de se superar a presunção de inocência constitucional. Durante muitos anos a Corte afirmou que a presunção de inocência impedia a prisão após o julgamento em segunda instância. Durante muitos anos foi assim. A partir, especialmente, de um julgamento histórico capitaneado pelo ministro Eros Grau [que discutiu o mesmo tema em 2009], em que se reafirmou, sobretudo em um país complicado como o nosso, no sentido do cumprimento dos direitos fundamentais, do que já está na Constituição. Mas, como uma visão mais punitivista, mais repressiva, passou a imperar no Brasil, houve uma inflexão da Suprema Corte. Por 6 votos a 5, entendeu-se [em 2016] que a partir da condenação em segundo grau se poderia mandar uma pessoa para a prisão. E o pior de tudo: automaticamente para a prisão, sem ponderar a situação pessoal do condenado, quando a nossa Constituição diz que ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem fundamentada de um juiz. A partir dessa inflexão do Supremo —essa sim, que causou estranheza, que causou perplexidade —, os tribunais passaram a prender as pessoas automaticamente, tendo elas cometido um crime grave ou não, sejam elas perigosas ou não para a sociedade.
P. Mas, ministro, temos que admitir que algumas revisões do STF criam divisões até mesmo dentro do Judiciário.
R. O Brasil sem dúvida nenhuma está muito dividido. As últimas eleições mostraram uma divisão quase equitativa do nosso eleitorado. Essa divisão, digamos assim, político-eleitoral da sociedade, se reflete também no dia a dia. Todos nós verificamos isso. Os ódios aumentaram. As incompreensões também se multiplicaram. Esse ambiente, de certa maneira, também atinge as instituições e, por que não, o próprio poder Judiciário. Agora, acho absolutamente inconcebível que juízes de 1ª ou 2ª instância se manifestem publicamente ou se insurjam contra decisões da Suprema Corte do país. Isso é anomia pura. Mal sabem eles que no momento em que descumprirem uma orientação da Suprema Corte, os juízes de 1º grau também descumprirão as decisões da segunda instância. Eventualmente, as decisões do juiz de de 1º grau podem ser descumpridas pelos cidadãos e pelos próprios administradores públicos. Um caos. O que, evidentemente, não se pode aceitar de forma nenhuma. Dentro do Estado democrático de direito, as regras precisam ser respeitadas. Goste-se ou não. Quem não gostar dessas regras precisa se candidatar a um cargo eletivo e tentar mudar as normas.
P. Como o senhor avalia a figura do juiz de garantias do pacote anticrime aprovado pela Câmara e sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro?
R. Esse é um avanço extraordinário. Eu sempre pugnei para que o juiz de garantia fosse adotado. Eu diria até que é um passo além daquilo que nós implantamos quando estivemos à frente do STF e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que foram as audiências de custódia. Demos cumprimento ao um dispositivo da Convenção Americana de Direitos Humanos, que estabelece que qualquer pessoa presa tem que ser imediatamente levada à frente de um magistrado, de um juiz. Por meio de uma resolução do CNJ ficou determinado que qualquer pessoa presa em flagrante deve ser encaminhada, no prazo de 48 horas, a um juiz. Essa providência teve resultados muito significativos. Segundo as últimas estatísticas, do ano de 2015, quando elas foram implantadas, até o ano de 2019, cerca de 200 mil pessoas foram liberadas mediante condições: tornozeleiras eletrônicas, comparecimento periódico ao juízo, suspensão de determinados direitos. E não foram jogados num sistema prisional dantesco. Hoje no Brasil nós temos 800.000 presos. Nós temos a terceira população carcerária do mundo e, desse número, 40% são presos provisórios, que jamais se defrontaram com um juiz. Passam meses, anos, sem serem ouvidos por um juiz, numa situação que o próprio STF classificou num julgamento histórico de “estado de coisas inconstitucionais”.
P. O que deve mudar agora com o juiz de garantias?
R. A audiência de custódia representou um avanço, e o juiz de garantia é um passo além, é um aperfeiçoamento. Qualquer pessoa uma vez defrontada com a Justiça criminal passa a ser colocada diante de um juiz de garantia, de um juiz de instrução, que vai verificar se a prisão é necessária, se medidas de caráter invasivo, como busca e apreensão em domicílio, quebra de sigilo fiscal, telefônico, bancários, são ou não pertinentes. Toda instrução criminal será feita por um juiz absolutamente independente que se coloca à margem ou longe do processo em si. Complementada essa primeira fase, que é a fase de instrução, o processo é passado para um juiz que vai julgar o mérito da questão. Ou seja, não há uma contaminação do juiz que vai julgar o mérito da ação penal com essas primeiras medidas de caráter instrutório. É um avanço civilizatório muito importante.
É possível implantar o juiz de instrução sem maiores despesas P. Mas este novo agente tem um custo. Será viável financeiramente, considerando que já há um déficit de juízes no Brasil?
R. A Justiça não tem custo, educação não tem custo, saúde não tem custo. São serviços públicos de caráter prioritário. A liberdade da pessoa humana é algo absolutamente fundamental, não tem preço. É preciso investir no juiz de garantias ou no juiz de instrução. É possível, ao meu ver, fazendo o remanejamento de varas, ou fazendo, eventualmente, trabalhos por turnos. É possível sem dúvida nenhuma implantar o juiz de instrução sem maiores despesas. E se tiver alguma despesa é uma despesa bem-vinda, um despesa benfazeja. Tem tantos gastos supérfluos da administração do próprio poder Judiciário que podem ser canalizados para o juiz de instrução…
P. O perfil hoje da Corte na área de costumes é considerado progressista. Mas teremos uma mudança importante nos próximos três anos. Estamos às vésperas da aposentadoria dos ministros Celso de Mello (2020) e Marco Aurélio Mello (2021), e também sua aposentadoria e da ministra Rosa Weber, em 2023. Como vê essa nova Corte, que será parcialmente constituída no Governo Bolsonaro?
R. O que se tem dito é que o Supremo Tribunal Federal é liberal nos costumes e punitivista em matéria de direito penal. Salvo exceções. Eu, por exemplo, sou um garantista. Entendo que se deve seguir rigorosamente aquilo que está na Constituição em relação aos direitos e garantias do cidadão. A verdade é que no nosso sistema de nomeação de juízes da Suprema Corte, que segue o modelo norte-americano, os juízes de certa maneira sempre trazem para os seus julgamentos um viés, amplamente considerado, daquele presidente da República que o nomeou. Se é um presidente em posições mais conservadoras, a tendência que é ele escolha um juiz mais conservador, seja em matéria de costumes, seja de direito penal. Mas isso também ocorre nos Estados Unidos. Talvez, tendo em conta este fato, e considerando também que a mudança social é extremamente dinâmica como jamais foi em outro período histórico, é possível que se possa, e penso que seja até desejável, cogitar mandatos para os juízes não só da Suprema Corte como das Cortes Superiores do país, a fim de evitar um certo engessamento de determinadas posições ideológicas ou determinadas visões de mundo. Ao invés do exercício do cargo vitalício, até o integrante do cargo atingir 75 anos, talvez pudéssemos adotar aqui no Brasil, como em outros países, um mandato de 10, 12 anos, oito anos…renovável ou não.
P. No artigo “Em defesa do Estado democrático de Direito”, publicado no final de novembro na Folha de S. Paulo, o senhor defende que um presidente está sujeito ao impeachment caso atente “contra o exercício dos direitos políticos, individuais ou sociais”, como no caso do emprego das Forças Armadas em operações para garantia da lei e da ordem (GLO) contra manifestantes. Foi um artigo de caráter educativo para os demais poderes?
R. Num país como o nosso, que a cada 25, 30 anos sofre um retrocesso institucional, é muito importante que esses instrumentos excepcionais que estão previstos na Constituição sejam utilizados com muita parcimônia. Intervenção da União nos Estados, dos Estados nos municípios, o estado de sítio, o estado de defesa e as operações GLO são instrumentos que devem ser utilizados apenas em caráter excepcionalíssimo, sob pena de se colocar em risco o próprio Estado democrático de direito. Foi esse o alerta que eu pretendi fazer.
É desejável cogitar mandatos para os juízes da Suprema Corte P. O senhor está falando de riscos de colapso institucional. Tivemos dois interlocutores do Governo federal falando em AI-5. Nossa democracia corre riscos?
R. A ameaça de utilização ou de reinstituição do Ato Institucional número 5 é de uma irresponsabilidade absoluta. Não é possível que homens públicos cogitem um retrocesso institucional dessa natureza. Tendo em conta esses episódios que estamos vivendo, prisões que não poderiam nunca ter sido efetivadas, certo atropelo de direitos fundamentais que se vê aqui ou acolá. Isso tudo faz com que cada vez mais os democratas tenham que, de forma muito explícita e muito ativa, defender a Constituição. A Constituição é nossa tábua de salvação. O que impedirá retrocessos é o cumprimento escrupuloso daquilo que se contém na Constituição, sobretudo os direitos e garantias dos cidadãos.
P. O sistemas de pesos e contrapesos está funcionando no Brasil? O senhor é mais otimista ou pessimista em relação à defesa da Constituição?
R. Não podemos ter uma visão fotográfica do momento histórico. O momento histórico é um fluxo, só podemos ter uma visão mais clara depois de certos anos, ou até décadas. Este é um momento em que, de fato, o STF tem uma certa preponderância, um peso maior, sobretudo se comparado com o passado, relativamente aos demais poderes. O Congresso Nacional está muito fragmentado do ponto de vista de sua base político-partidária. Existem hoje cerca de 32 partidos políticos, e isso dificulta a tomada de decisões por parte do Congresso. As decisões são muito ad hoc, não existem posições ou decisões que são tomadas a partir de uma visão mais programática, principiológica, que é própria de um sistema partidário mais enxuto, com partidos que realmente tenham essa característica. O poder Executivo também está de braços dados com crises políticas, crises econômicas recorrentes. E o Supremo Tribunal Federal, neste momento, exatamente por decidir questões importantíssima com a maioria de 6 votos, tem condição de dar solução para os problemas que se colocam para a sociedade brasileira de forma mais célere. Mas eu imagino que, num momento futuro em que o Congresso Nacional se fortaleça e que o próprio poder Executivo possa controlar melhor o destino do país e nadar de forma mais tranquila nesses mares revoltos que vêm da política internacional, da geopolítica, o Supremo também perderá esse protagonismo que tem no momento presente.
P. Como o senhor avalia o combate à corrupção no Brasil?
R. O combate à corrupção é necessário. Todos nós queremos combater a corrupção. Mas, infelizmente, no Brasil, o combate à corrupção sempre foi um mote para permitir que se promovessem retrocessos institucionais. Foi assim na época do suicídio de Getulio Vargas, foi assim em 64. É uma visão moralista política do combate à corrupção, a meu ver, absolutamente deletéria. O combate à corrupção tem que ser feito diuturnamente, permanentemente, mas existem outros males igualmente graves no Brasil: a má distribuição de renda, a exclusão social, o sucateamento da educação, a precarização da saúde pública. São males que equivalem, se não são superiores, ao mal da corrupção.
P. O STF é muito criticado na hora de pautar a agenda de julgamentos, pela falta de transparência. Como o STF prioriza as pautas?
R. Há certa discricionariedade por parte do presidente no que diz respeito à pauta. Eu já fui presidente e posso dizer que existem dois requisitos para pautar um determinado processo: avaliação da urgência e da importância. Isso não é feito apenas de forma isolada. Consultam-se os pares, de certa maneira, há pressão das partes. Agora temos, em média, 700 processos para serem julgados pelo plenário do STF, é sempre uma escolha de Sofia. Mas não uma escolha totalmente aleatória. Claro que existe um certo desejo por parte da mídia, por parte da opinião pública, de que certos assuntos tenham prioridade em relação a outros. Mas isso não é possível.
Fui o relator das cotas raciais nas universidades públicas, um avanço extraordinário P. Por exemplo, o fim do julgamento sobre a suposta suspeição do ex-juiz Sérgio Moro, pedido pela defesa do ex-presidente Lula. Havia uma expectativa de que seria realizado em 2019.
R. Mas, nesse caso, determinado ministro pediu vista [Gilmar Mendes] e ele devolverá a vista quando entender que o processo está maduro para ser julgado. Já não tem nada a ver com a pauta, que é aquela determinada pelo presidente do STF e que sofre uma série de junções, de pressões e, afinal de contas, o presidente tem que decidir. Os presidentes da República, do Senado, da Câmara, do STF, são eleitos para tomar essas decisões.
P. Os pedidos de vista também costumam demorar além do que prevê o regimento.
R. A Justiça é demorada também. Se nós escolhermos o processo “a”, desagradaremos “b” ou “c”. Sempre tem alguém que vai achar que o processo dele tem preferência, é uma escolha de Sofia.
P. Ministro, quais foram os principais acertos da Corte desde que o senhor começou?
R. Eu sou um pouco suspeito para falar porque fui o relator das cotas raciais nas universidades públicas. Esse foi um dos raros processos em que o voto do relator, ou seja, o meu voto, foi aprovado por unanimidade pelos membros do Supremo Tribunal Federal. Isso, ao meu ver, foi um avanço extraordinário no que diz respeito à integração dos negros, dos índios, e de outros segmentos mais carentes da população na universidade pública. Recentemente, o IBGE fez uma pesquisa que mostra que hoje mais de 50% da população universitária é constituída por negros. Isso me parece um avanço extraordinário.
P. E quais são os casos em que o senhor não é suspeito de falar?
R. Por exemplo, uma decisão na qual fui vencido em parte, porque achei que deveríamos ter estabelecido alguns parâmetros mais restritos, foi no sentido de liberar as pesquisas com células-tronco embrionárias humanas. Isso é muito importante para as pesquisas científicas do Brasil. Eu fui vencido em parte porque achei que os limites tinham que ser mais estritos. Mas nós liberamos isso com certa generosidade. Isso, ao meu ver, foi um avanço. Outra questão, em que eu também por acaso fui relator, foi o habeas corpus coletivo para as mulheres presas. Nós criamos esse instrumento, que não estava previsto na Constituição, dizendo que as mulheres gestantes, lactantes e mães de crianças até 12 anos não deveriam mais ser presas. Porque no fundo, no fundo, quem está preso é um brasileirinho inocente que fica atrás das grades. Então são alguns marcos importantes que o Supremo estabeleceu.
P. Como o senhor vê o futuro da Justiça do Brasil?
R. Eu penso que o futuro da Justiça, não só no país, mas em todo o mundo, é no sentido de tirar da Justiça uma série de questões que podem ser resolvidas pela própria sociedade. Eu mesmo, quando fui presidente do CNJ, tendo em conta os 100 milhões de processos que estavam tramitando na época, hoje talvez um pouco mais, fiz o esforço, juntamente com os demais magistrados de todo o país, para prestigiar a conciliação, a mediação e a arbitragem. Ou seja, tirar do Judiciário uma série de questões, sobretudo aquelas que dizem respeito a direitos disponíveis, para permitir que o Judiciário se debruçasse sobre as questões mais relevantes.
P. O senhor comentou sobre o momento de mares revoltos que vive o Brasil e a necessidade de os democratas enaltecerem a Constituição para marcar posição contra os arroubos autoritários. Qual o papel do STF no sentido de acalmar esses mares revoltos?
R. O papel do STF e do Judiciário brasileiro só pode ser julgado daqui alguns anos, daqui a algumas décadas. Não podemos julgá-los a partir das emoções que estão à flor da pele neste momento histórico. Mas o Judiciário vem representando um papel de consolidação da democracia, de estabilidade das instituições republicanas. Basta ver, por exemplo, o papel da Justiça Eleitoral. A partir da Constituição de 88, sobretudo, a Justiça Eleitoral tem representado um papel importantíssimo no sentido de fazer com que os resultados das eleições sejam aceitos sem maiores contestações. Eu mesmo fiz uma eleição geral como presidente do TSE disputadíssima, em que foi eleita a primeira mulher, Dilma Rousseff. A eleição foi apurada em poucas horas a partir das urnas eletrônicas. E a partir disso não se contestou, pelo menos contestação séria ou jurídica, o resultado das eleições. O próprio STF, seja na pauta de costumes, seja em questões que afetam o dia a dia do cidadão, ou mesmo nas questões criminais, tem decidido, às vezes por maiorias apertadas, e a questão se pacifica em toda a sociedade. Existem descontentamentos aqui e acolá, sobretudo em matéria criminal, mas de modo geral eu penso que as nossas decisões não são contestadas, são aceitas e militam no sentido de pacificar a sociedade.
O novo capítulo da crise entre EUA e Irã pode acabar afetando as exportações brasileiras.
Agentes do mercado agrícola consideram que um eventual aprofundamento da tensão aumentará ainda mais a pressão da Casa Branca para que seus aliados, entre eles o Brasil, isolem cada vez mais Teerã. Do lado iraniano, porém, diplomatas confirmaram que será cada vez mais difícil manter relações comerciais com países que tenham chancelado os atos de Donald Trump.
O resultado poderia se traduzir em perdas para as exportações agrícolas brasileiras, ainda que uma parcela dos importadores iranianos e mesmo parte do governo insistam para que o comércio com o Brasil seja preservado.
Na semana passada, diante da morte do general iraniano Qasem Soleimani, o governo brasileiro emitiu uma nota de apoio à operação conduzida pela Casa Branca. Mas o que deixou os iranianos especialmente irritados foi o tom usado pelo Itamaraty, descrevendo o ato como um combate ao terrorismo.
Diante da insinuação de que seu governo seria equiparado a um grupo terrorista, Teerä convocou a diplomacia brasileira a se explicar, na segunda-feira. Ainda que o Itamaraty insista que a reunião foi cordial, fontes diplomáticas confirmaram à coluna que se tratou de um protesto formal contra o Brasil.
Tradicionalmente, o Brasil tem evitado a designação de grupos como entidades terroristas, justamente para manter um canal de diálogo. O mesmo procedimento foi adotado por anos em relação às Farc, ainda no governo de Fernando Henrique Cardoso e depois sob a gestão de Luiz Inácio Lula da Silva.
No comunicado emitido na noite de sexta-feira, o governo brasileiro surpreendeu até mesmo seus aliados ao seguir de forma explícita a narrativa da Casa Branca e insinuar que o ataque foi contra o terrorismo, não contra um representante de um governo soberano.
Na OTAN ou em governos europeus, o tom de críticas contra o Irã foi duro nos últimos dias, principalmente diante da proliferação de milícias bancadas pelos iranianos na região. Mas poucos se aventuraram a tratar o general de terrorista.
Mas insistência de Trump e de seus aliados de tratar o governo iraniano como “terrorista” levou, nesta terça-feira, o Parlamento iraniano a declarar “todas as forças americanas como terroristas”. Isso incluirá o Pentágono e suas organizações afiliadas.
Mas o Parlamento vai além: “toda a ajuda a essas forças, incluindo militar, inteligência, financeira, técnica, serviço e logística será considerada como cooperação com ato terrorista”. Diplomatas Ocidentais questionam se, eventualmente, esse trecho da lei poderia ser usado para designar países estrangeiros que cooperem com os militares americanos como cúmplices de atos terroristas.
Exportações
Fontes em Teerã confirmaram que, diante da nova crise, pode haver uma reavaliação de contratos comerciais com fornecedores de países que deram apoio aos americanos, ainda que o ritmo de tal medida dependerá de como tal fornecimento será substituído.
Hoje, o Irã é o quarto maior destino das exportações de alimentos nacionais. Entre todos os parceiros comerciais, o mercado iraniano está entre os 25 maiores.
Em 2019, os iranianos importaram mais de US$ 2,1 bilhões de produtos agrícolas brasileiros. Quase metade foi do setor do milho.
Mas abrir mão desses produtos pode ser uma tarefa complicada. Um dos maiores aliados do Brasil é justamente o setor importador iraniano.
O sentimento é de que, sem o fornecimento do Brasil, as compras de soja, carne ou milho seriam encarecidas, aumentando o preço final dos alimentos no mercado já combalido do Irã.
Mas a pressão também pode vir do lado americano, principalmente se houver uma escalada ainda maior da crise.
No final de 2019, toneladas de trigo foram barradas nos portos diante das medidas adotadas pelo governo americano de sancionar quem mantinha um comércio com o Irã.
No caso do Brasil, dois navios que transportavam milho para o Irã se transformaram em um incidente diplomático, depois que o abastecimento dos barcos foi questionado. A Petrobras, temendo as sanções americanas, se recusava a vender combustível para permitir que esses navios pudessem deixar os portos brasileiros.
O cenário, a partir de agora, pode se intensificar.
Para escapar das sanções americanas, exportadores brasileiros já tinham começado a buscar portos alternativos para evitar chamar a atenção. Parte da exportação, por exemplo, segue hoje para a Turquia e, de lá, continua a viagem por terra até o Irã. Dubai também tem sido tradicionalmente usado como “entreposto”.
Mas a prática pode ser cada vez mais difícil de ser implementada, já que os pagamentos precisam ser feitos pelo importador iraniano.
A Petrobras terá uma nova estratégia para os anos 2020. Num período em que, diferentemente dos anos 2010, quando a petroleira tirava vantagens da alta dos preços do petróleo no mercado internacional e se tornou uma das maiores empresas integradas de energia do mundo, o novo plano indica que se tornará uma empresa mais “enxuta”, concentrada apenas nos projetos de maior retorno, com foco em exploração e produção de óleo e gás.
O reposicionamento estratégico traz boas perspectivas de rentabilidade para seus acionistas, mas ao mesmo tempo expõe a companhia aos riscos de flutuações.
Reportagem do jornal Valor informa que o atual plano de negócios da Petrobras prevê a saída da estatal de campos maduros em terra e águas rasas, da petroquímica Braskem, dos setores de transporte e distribuição de gás natural e da produção de biocombustíveis e fertilizantes. Além disso, a petroleira vai reduzir sua fatia no refino.
A Petrobras também reduzirá geograficamente o seu raio de atuação, concentrando-se cada vez mais no Sudeste. A empresa privatizará todas as suas refinarias fora do eixo Rio-São Paulo e pretende sair de campos terrestres e em águas rasas – concentrados, sobretudo, no Nordeste.
A petroleira espera também se desfazer dos ativos remanescentes na América do Sul.
Essas mudanças demonstram o abandono da estratégia de desenvolvimento nacional.
Segundo a reportagem, o presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, espera que esse movimento de transformação se acentue nos próximos dois anos. A expectativa é que a Petrobras se consolide como uma grande exportadora de petróleo cru.
Para o sócio da área de energias e recursos naturais da KPMG, Anderson Dutra, o movimento da Petrobras é positivo. Segundo Godofredo Mendes Vianna, sócio sênior do escritório Kincaid Mendes Vianna, o movimento da Petrobras de se concentrar em exploração e produção é irreversível.
Por outro lado, Rodrigo Leão, coordenador do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis Zé Eduardo Dutra (Ineep), vinculado à Federação Única dos Petroleiros (FUP), contesta o enfoque quase exclusivo da companhia na atividade de exploração e produção – que absorverá 85% dos investimentos para 2020-2024, de US$ 75,7 bilhões.
Segundo Leão, a saída da Braskem e da produção de biocombustíveis, além da redução de sua presença no refino, colocam a petroleira numa situação de dependência das variáveis do mercado externo (como preços e demanda), num movimento “atípico” em relação aos seus pares globais.
Ele lembra que as grandes estatais de países em desenvolvimento, sobretudo da China, Índia e Arábia Saudita, têm investido na expansão do parque de refino para reduzir a dependência dos derivados do exterior. “As petroleiras desses países têm estratégias diferentes, mas convergem na preocupação de não se concentrarem apenas em exploração e produção. A Petrobras está fazendo o caminho que as outras estão evitando, de depender de exportações de óleo cru. Ela está olhando muito para o curto prazo”, defende Leão.
O pesquisador do Ineep também questiona a venda da Braskem. A Agência Internacional de Energia (AIE) projeta que, diante do impacto da eletrificação dos carros sobre o consumo de combustíveis, um terço do crescimento da demanda de petróleo virá da petroquímica em 2030. “Os derivados têm um ciclo de preços menos instável, seguram mais a volatilidade do mercado do que os preços do óleo cru. Ajudam a atenuar a volatilidade”, explica.
Acima, dois gráficos da pesquisa divulgada na sexta-feira 13 de dezembro pelo Vox Populi
Castello Branco usa dívida e pagamento de juros para tentar justificar privatizações e redução dos investimentos da Petrobrás
Em palestra na Comissão de Infraestrutura do Senado, Roberto Castello Branco, atual presidente da Petrobrás, apresenta: O endividamento reduz direta e indiretamente a capacidade de investir e de competir por novas áreas.
• O alto nível de endividamento consome recursos que poderiam gerar riqueza para nosso País sob a forma de milhares de empregos e muitos bilhões de reais de receita para o Estado, nas três esferas de poder (federal, estadual e municipal)
• São quase US$ 7 bilhões anuais pagos a título de juros, valor suficiente para instalar a cada ano um sistema completo de produção de petróleo e gás com capacidade de produzir 150 mil barris diários
• No leilão de excedentes da cessão onerosa, a PETROBRAS só foi capaz de manifestar interesse em 2 dos 4 blocos oferecidos pois seu custo de capital é superior ao retorno esperado. Seria como tomar empréstimo no banco para aplicar em caderneta de poupança” (Branco, 2019) Relação entre dívida, alavancagem para investimentos e juros Castello Branco afirma: “Anualmente a Petrobrás paga quase US$ 7 bilhões de juros… com esses recursos nós poderíamos investir em 1 sistema para produção de 150 mil barris diários…” (Branco, 2019)
O endividamento é resultado do empréstimo de recursos de terceiros para alavancar investimentos e aumentar a produção no desenvolvimento da província do pré-sal e na agregação de valor ao petróleo cru.
Se os juros de US$ 7 bilhões anuais são equivalentes a 1 sistema de produção de 150 mil barris por ano, a dívida bruta atual de US$ 101 bilhões é equivalente a instalação de 14 sistemas de produção.
Seriam necessários 14 anos economizando com o não pagamento de juros para instalar o número de sistemas que se pode antecipar com esses recursos de terceiros.
Com a alavancagem por recursos de terceiros foi possível a antecipação dos investimentos a partir dos quais foram gerados empregos, pagos impostos e foi antecipado o aumento da produção e da geração de caixa da Petrobrás.
A participação da Petrobrás no desenvolvimento do campo de Lula, na Cessão Onerosa e nos cinco primeiros leilões de partilha do pré-sal foi potencializada pelo acesso aos recursos de terceiros e endividamento.
Falácia da privatização para redução da dívida da Petrobrás.
As reduções da dívida e da alavancagem da Petrobrás têm sido utilizadas como pretexto para a privatização dos ativos da companhia.
Desde 2016 afirmamos que não é necessário vender ativos para administrar e reduzir a dívida da Petrobrás. (Coutinho & Assis. Existe alternativa para reduzir a dívida da Petrobrás sem vender seus ativos,2016).
A Petrobrás reduziu sua dívida líquida de US$ 115,4 para US$ 69,4 bilhões e sua alavancagem (dívida liquida / EBITDA ajustado) de 4,25 para 2,20, entre o final de 2014 e de 2018.
Nesse mesmo período de quatro anos, a Petrobrás vendeu ativos no valor de US$ 18,72 bilhões.
Deste total, os valores efetivamente recebidos em caixa totalizaram US$ 11,81 bilhões. Esta dívida poderia ser reduzida, mesmo sem a entrada no caixa dos US$ 11,81 bilhões.
Na realidade, as privatizações tiveram influência pouco relevante na redução do endividamento líquido da companhia.
Limitou-se a 25,65% da redução da dívida líquida, entre 2015 (final de 2014) e 2019 (final de 2018), que pode ser atribuída a venda de ativos.
Cerca de três quartos (74,35%) da redução da dívida teve origem na geração operacional de caixa da Petrobrás. (AEPET, A falácia da privatização para redução da dívida da Petrobrás, 2019)
Avaliação dos “maus investimentos” e da corrupção na formação da dívida da Petrobrás Em síntese, concluímos que do total da dívida existente no final de 2014 (US$ 136,04 bilhões), 4,5% corresponde aos investimentos ditos “improdutivos” e 3,6% corresponde aos efeitos da corrupção.
Ressaltamos que os dois resultados não podem ser somados porque existem efeitos redundantes pelo impacto da corrupção na “improdutividade” dos ativos.
Assim pôde ser revelada a lenda da origem perversa do endividamento que alimenta o mito da Petrobrás quebrada e suporta ideologicamente o objetivo da privatização fatiada da estatal que é disfarçada pela meta da redução da alavancagem. (Oliveira & Coutinho, Avaliação dos “maus investimentos” e da corrupção na formação da dívida da Petrobras, 2017)
Relação entre endividamento e custo de capital Castello Branco afirma: “Esse endividamento excessivo faz com que a Petrobrás tenha um custo de capital superior aos seus concorrentes” (Branco, 2019).
Castello Branco argumenta que seria necessário reduzir a dívida para diminuir o custo de capital da Petrobrás. Em 2014, o endividamento da Petrobrás era de US$ 132,1 bilhões e a taxa média dos financiamentos de 5,6% ao ano.
Em 2018, a dívida foi reduzida para US$ 84,4 bilhões e taxa se elevou para 6,1% ao ano. (Petrobras)
Não existe evidência de relação de causa e efeito entre redução do endividamento e diminuição do custo de capital.
Outros fatores determinam a disponibilidade de recursos e seus custos, como por exemplo a perspectiva de crescimento e de lucratividade da companhia, além das condições econômicas do Brasil e do mundo.
Redução dos investimentos Entre 2009 e 2014 a Petrobras investiu cerca de US$ 300 bilhões (em valores atualizados), média anual de US$ 50 bilhões.
Para 2019 se prevê investimentos de cerca de US$ 10 bilhões.
Entre 2020 e 2024, o planejamento da Petrobras projeta investimento médio anual de US$ 15 bilhões (PNG 2020-2024).
Foi dito que a verdade é filha do tempo e não da autoridade. Resta saber quanto tempo será necessário para que a verdade relativa ao mito da Petrobrás quebrada e à falácia da necessidade das privatizações dos seus ativos para administração da dívida seja aceita com naturalidade.
* Felipe Coutinho é presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobrás (AEPET)/Viomundo
Flavio Dino desanca os Filhos de Januário na perseguição criminosa ao filho de Lula:
“Qual a relação entre Vivo, Oi e Petrobras ? É que na Petrobras as pessoas usam telefones?
Não há “direito excepcional” que explique essa competência eterna de Curitiba para julgar o presidente Lula e família. Sou a favor de investigações, mas com respeito às LEIS.”
A investigação que baseou a fase da Lava Jato desta terça-feira 10 apura pagamentos da Oi para empresas ligadas a Lulinha e seus sócios. Segundo a Lava Jato, parte desses recursos pode ter sido usada para a compra do sítio de Atibaia, pelo qual Lula também já foi condenado pela 2ª instância.
Além do que disse Flavio Dino, lembremos que essa narrativa bisonha que a Lava Jato criou contra Lulinha para investigá-lo, em Curitiba, por causa de negócios do grupo Gamecorp com a Oi/Telemar, já foi alvo de dois inquéritos no passado.
Ambos os casos, terminaram arquivados em Brasília e São Paulo, em 2012.
O mesmo aparato jurídico usado pelos Filhos de Januário para esconder da sociedade os crimes de Moro na condução da Lava Jato por baixo dos panos, contra Lula, volta a carga com os mesmos Filhos do corrupto Januário Paludo produzindo uma gigantesca lambança.
O nome disso é burrice aguda ou certeza de impunidade.
Eles foram cúmplices tanto nos crimes de Moro, revelados pela Vaza Jato do Intercept quanto os de Januário Paludo, que recebia mesada mensal de Messer, o doleiro dos doleiros, e nada aconteceu contra eles, por corporativismo do MP, dos filhotes do juiz e procuradores corruptos, acharam por bem aplicar outro Lawfare na praça contra o filho de Lula para atingir Lula.
Só que fizeram o oposto.
Dallagnol, o gatuno dos bilhões da Petrobras, que viu seu roubo ser abortado pelo STF, escreveu no Twitter:
“69ª fase apura repasses suspeitos de mais de R$ 132 milhões pelo grupo Oi/Telemar para empresas do grupo Gamecorp/Gol. Evidências apontam que parte dos recursos foi utilizada para a aquisição do sítio de Atibaia no interesse do ex-Presidente Lula”
Como resposta teve o que merece um vigarista que posa de paladino do combate à corrupção. Uma chuva de comentários espinafrando o picareta.
Claro que o caso foi parar na Globo como certamente foi combinado entre Moro e os Marinho.
A mesma Globo que nada falou sobre a Vaza Jato, o mensalão do Pai Januário e a Fundação da Lava Jato com grana da Petrobras, já lascou no Jornal Hoje mais uma fake news Lava Jato.
Só não dá para entender o que a OI/TELEMAR tem a ver com a Petrobrás, Moro e a Lava jato de Curitiba.
Essa operação fabricada por Moro e os filhos de Januário não tem nada a ver com Petrobras que justifica o circo da Lava Jato.
Na verdade quando dizem que evidências apontam que parte dos recursos foi utilizada para a aquisição do sítio de Atibaia no interesse do ex-presidente Lula, estão afirmando que o caso do sítio nada tem a ver com Petrobras, ou seja, nada tem a ver com a Lava Jato e, muito menos com Moro e a juizeca copia e cola.